As causas do desenvolvimento de países de industrialização tardia, como a Coreia do Sul, é um dos embates mais polêmicos entre economistas heterodoxos e ortodoxos.
Como os dados abaixo mostram, a Coreia do Sul teve uma forte aceleração no seu setor industrial a partir dos anos 50, o que gerou também um crescimento na renda per capta da população.

Esse movimento é seguido até hoje, ao contrário de países como o Brasil, que teve o seu desenvolvimento interrompido em meados dos anos 80.
Para os economistas ortodoxos, foram as reformas pró mercado, a política de Estado mínimo, e o equilíbrio fiscal – diminuição dos déficits fiscais a partir dos anos 70 – que permitiram a Coreia do Sul se modernizar.

O argumento desse grupo é que, com um cenário internacional favorável à economia sul coreana, a política liberal permitiu a atração de capitais estrangeiros para financiar o desenvolvimento e crescimento do país.
A perspectiva desenvolvimentista
Para os economistas desenvolvimentistas, o sucesso do desenvolvimento da Coreia do Sul se deu pela dominância do paradigma político desenvolvimentista.
Os autores dessa corrente focam em explicar como o quadro institucional da política industrial contribui para o processo de modernização produtiva e aquisição/reprodução tecnológica de um país.
Dentro do quadro geral de medidas realizadas pela Coreia do Sul, temos: 1) realização de política industrial; 2) direcionamento dos gastos públicos e subsídios para a promoção da indústria nacional; 3) estatização do sistema bancário (entre os anos 50 e 80); 4) implementação de uma política seletiva de investimentos diretos estrangeiros (IDE), na qual houve exigência de uso de componentes locais e quotas obrigatórias de exportação; 5) criação de instituições para a promoção de P&D pelo setor privado.
Assim, os desenvolvimentistas afirmam que foi a partir destas medidas que o país experimentou um período virtuoso de crescimento industrial e da produtividade.
Algumas das etapas da política industrial sul-coreana são resumidas na tabela abaixo:

Entretanto, não se pode negar que o país tenha negligenciado a estabilidade econômica, visto que o governo realizou várias rodadas de estabilização macroeconômica, principalmente quando a inflação, o endividamento e o déficit em conta corrente começavam a sair do controle.
É importante ter em mente que o desenvolvimentismo não é sinônimo de irresponsabilidade fiscal. A diferença está basicamente no horizonte de tempo. Enquanto ortodoxos preconizam o equilíbrio fiscal tanto no curto quanto no longo prazo, o desenvolvimentismo defende que períodos de déficit, no curto prazo, são aceitáveis para financiar uma modernização produtiva, pois acredita-se que esta estratégia entregará retornos futuros ao país.
No caso da Coreia do Sul, argumenta-se que os resultados positivos das políticas estatais de fomento industrial foram criando condições, ao longo do tempo, para que as necessidades de estabilização macroeconômica não causassem problemas à indústria, à trajetória de desenvolvimento e ao crescimento.
Outra crítica dos economistas desenvolvimentistas é que as reformas liberalizantes, que os ortodoxos colocam como causa principal do desenvolvimento do país, começaram a ser discutidas e planejadas quando a base industrial do país já estava bem estabelecida, por volta dos anos 80.
Algumas considerações
A orientação da política macroeconômica para o desenvolvimento sul coreano deve ser avaliada em seu contexto histórico.
Cada passo foi importante para o desenvolvimento industrial.
Tanto as políticas desenvolvimentistas, de promoção do crescimento e industrialização, quanto os períodos de austeridade e estabilização, de cunho ortodoxo, foram determinantes para que o país conseguisse aproveitar do cenário internacional favorável.
Se no Brasil as reformas liberalizantes tiveram como resultado jogar o país numa trajetória de especialização regressiva em commodities, na Coreia do Sul foi diferente.
No país do Leste Asiático, a mentalidade modernizante foi institucionalizada já no período desenvolvimentista (1950 – 1980), de modo que as reformas liberalizantes não geraram riscos para a estrutura produtiva nacional.

Além disso, a mudança de paradigma mostrou que o país não precisava mais dar tanta proteção ao capital nacional, visto que ele apresentava a robustez suficiente para enfrentar o mercado internacional.
Embora as reformas liberalizantes tenham contribuído para a estabilização da inflação e atração de fluxos externos, as instituições continuaram tendo papel importante na orientação dos empreendimentos do país, conforme as políticas e instituições citadas no quadro anterior.
Dica de leitura
Para aqueles que gostariam de aprofundar seu conhecimento sobre as políticas e instituições que levaram à industrialização dos países do Leste Asiático, uma ótima indicação é a obra de Alice Amsden, intitulada “A Ascensão do Resto: Os desafios ao Ocidente de economias com industrialização tardia“.
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Resumo: Depois de um século de lutas, uma dúzia de países fora do tradicional eixo desenvolvido (Europa-América do Norte), de experiência manufatureira anterior à Segunda Guerra Mundial, alcançaram a órbita da indústria moderna. A ascensão do “resto” não teve precedentes. Pela primeira vez, países sem o acervo competitivo de tecnologia pioneira básica tornavam-se potências econômicas. Como se firmou a industrialização entre esses tardios ingressantes, por que seguiram novos caminhos e o que alguns países fizeram para avançar mais do que outros são algumas das questões enfrentadas por este livro.